quarta-feira, 25 de março de 2009

Resíduos VII Federico e eu

Não posso me dar ao desbunde (para usar um termo "fabianístico") de citar quaisquer trechos do poeta viajão. A leitura parece promover mais viagens do que as próprias feitas pelo autor. Em mim, provocou o inconsciente, que se manifestou em sonho e fome: sempre, ao recorrer ao Poeta en Nueva York, (que só li na lingua "madre"), corria à cozinha e me empanturrava, vorazmente. Certamente, se estivesse de corpo presente na reunião da casa do Theo, que cozinha muito bem obrigado!, teria causado certo prejuízo, como de costume.
Como disse essa semana o nosso gentil e pensante ministro da cultura, Juca Ferreira, "a arte alimenta o espírito". O estômago ficou aliado ao espírito e pediu alimento da maneira que lhe cabe (e na proporção também) para viajar com Federico, o marido de Dalí. A escrita desse homem triste e viajado deixou-me inicialmente "boiando" entre palavras e combinações bem-feitas de versos naquele lindo idioma. Mais do que o que ele estava relatando, ou divagando em sua poesia, ó poeta, dirijo-me diretamente a outras possibilidades suas de escrita. Qual era a cor do seu papel? A sua caneta (ou pena!!!) foi produzida em Cuba? O estômago desse homem hispânico estava cheio ao passear a ponta da caneta (ou pena!!!) pelo papel? Vejo um papel roxo claro, uma caneta minuciosamente polida (sim, barroco!) e uma marca qualquer escrita em... español!! Por supuesto, no?
Ao ler os primeiros poemas de Federico, dormi, após comer. Sonhei com uma aula de estágio que fiz na 3ª ou 4ª fase de cênicas, na UDESC. Nela, estavam todos os meus amigos e colegas que passaram pelo curso, deixando-o cedo ou tarde. Aquela aula, que meu sonho proporcionou reviver, reunia todos aqueles que um dia passaram pela mínima experiência de cursar teatro na faculdade. Federico também passou pela experiência de escrever em español em terras americanas do norte. Possivelmente, com uma caneta barroca em papel roxo. O sonho me acalentou e demorou alguns dias pra eu concluir, ou esboçar: foi porque eu li Federico.
Corri ao guarda-roupa, onde guardo roupas e uma obra do sugestionável Federico chamada "Assim que se passarem 5 anos", texto teatral que ele intitula ser "um devaneio sobre como vejo o tempo passar e a natureza se transformar". Como aquelas palavras se parecem com os poemas do Central Park! Li novamente toda a peça. Divaguei possibilidades de encenação - como não fazer isso?! - comi e voltei à Nueva York com Federico. E aí... vi tanto Tadeusz Kantor, que também dança sua(s) morte(s), bem como vi todas as suas mulheres sofridas e derrotadas pela terra e pelo acontecimentos de uma espanha forte, masculina(o), pontiaguda, em meio à guerra e ao cuidado com o futuro. Mas tudo que não consigo ver é o futuro em quaisquer versos de Federico. Sabe-se de agora e de antes. Até mesmo do já! Depois, futuro, lá na frente... nada disso me aparece nele. Espera-se a morte para o próximo verso e ela não vem. Espera-se um filho para pobre Yerma do deserto e ele não vem. Segura-se o filho da pobre mãe de sangue e ele se vai pelo corte da navalha dos Félix. E Alba trancafia seu luto por sete anos sem abrir portas e janelas. A trilogia espanhola da dor é a coletânea do suspense poético americano de Federico. O que Dalí acharia desse surrealismo literário?
Não li nada relacionado ao momento da escrita de Federico. A obra me caiu deliciosa por sí. Eu, que sou um amante dos "making off" e das trajetórias artísticas fiz essa opção. Foi como quando li "Escrita com o livro de Jó", tese da dona Denise. O apêndice onde ela relata seu percurso de escrita apareceu-me como um pedido do orientador e não parte da obra, pois a obra já diz (e como diz!) e contempla toda possibilidade imaginativa do "como", "onde", "por que", etc... Fiquei receoso de encontrar em algum momento informações sobre a cor do papel e da caneta.
[em mensagem do Fabiano, lá de Campinas]

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